sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Cai a máscara

A nação esmeraldina começa a entender porque o Goiás não consegue chegar a um título nacional

Giuliano Cabral


O Goiás enfrenta uma crise financeira que resulta dos compromissos assumidos pelo clube nos últimos 12 anos, que se agravou com as duas administrações seguidas de Raimundo Queiroz, o que resultou, após a sua saída, em uma auditoria que tinha como objetivo verificar o tamanho do rombo, estimado entre 16 e 19 milhões.
Entre as acusações do vice-presidente de futebol do Goiás Edmo Pinheiro ao ex-presidente Raimundo Queiroz divulgadas pela imprensa esportiva goiana, o Presidente do Conselho Deliberativo Hailé Pinheiro resolveu não divulgar o resultado para a imprensa. Para ele, esses dados interessam “somente aos sócios do Goiás”.
Queiroz alega ter encontrado um rombo de 9 milhões quando chegou à sua primeira administração, dívida que vinha crescendo desde o final da década de 1980. De qualquer maneira e aproveitando as especulações sobre seu destino, o clube optou por não revelar o resultado da auditoria.

Ponto crítico
Para entender a crise que tomou conta do Goiás durante o primeiro semestre de 2007, a análise passa por diversos fatores que influenciaram na atual fase por que o time passa. Uma bola de neve que vem crescendo desde o final da década de 1980. Fora o aspecto financeiro, o Goiás se revelou nesse ano um time sem projeto de vencer campeonatos, com conflitos internos entre jogadores veteranos e as estrelas de renome nacional, e uma torcida insatisfeita com o desempenho do time tanto nos campeonatos regionais quanto nos nacionais, como as campanhas medíocres no Campeonato Goiano e da Copa do Brasil. Para um time que se intitula o maior do Centro-Oeste é pouco.
Num primeiro momento relutante em relação à idéia de reeleição, ao constatar o déficit nas finanças que começava a ficar sério, Raimundo Queiroz atribuiu o problema à administração de João Fogueteiro, seu antecessor. Como resultado do problema de caixa o Goiás vendeu Rodrigo Tabata e mais 50% do passe de André Leone para entregar o caixa de sua administração em dia. Houve também, na época, um acordo mensal de 100 mil reais com a empresa de petróleo Luppi para sustentar as categorias de base.
Como o Goiás é uma empresa particular e tem seu próprio estatuto, as dívidas hoje são atribuídas aos diversos presidentes que passaram pelo clube desde a década de 1990. Acredita-se hoje que todos os dirigentes foram deixando números negativos a serem saldados pelos seus sucessores. A culpa caiu em cima de Raimundo Queiroz pelo fato da convocação do Conselho e a mudança no estatuto do time, culminado na sua reeleição. Para quem tem renda praticamente do Campeonato Brasileiro, é de se entender que o clube trabalha pelo menos cinco meses ao ano no limite.
Para Rafael Gabardo, ex-apresentador do programa A Hora da Força, na Rádio 730, e integrante da torcida organizada Força Jovem, um dos motivos da crise no clube vem da “sucessão de erros que geraram dívidas a instantâneo, médio e longo prazo, que precisam ser honradas. A atual diretoria pegou o Goiás numa situação de quase-crise e não assume isso. Muitas coisas das administrações passadas são obscuras”.
Entre uma acusação e outra, quem está tendo o maior trabalho é Hailé Pinheiro, que tenta acalmar os ânimos da atual e antiga diretoria. Há pouco tempo, Edmo Pinheiro, foi a uma rádio da capital e criticou duramente a gestão de Raimundo Queiroz, pois as suspeitas indicavam fraudes nas finanças do clube na gestão do último dirigente esmeraldino. O ex-presidente foi à televisão, deu suas explicações e ficou por isso mesmo.

Pulo do gato
Durante sua administração, Raimundo Queiroz colocou seu filho, Igor Queiroz, como procurador de boa parte do elenco do clube. “Raimundo tentou perpetuar a fórmula de buscar jogadores no Nordeste e no interior do país. Como deu certo com marquinhos, Josué e Marabá, ele insistiu na idéia”, afirma Rafael Gobardo.
As críticas partem dessa relação de Igor Queiroz como olheiro e procurador de jogadores para fazer dinheiro no clube. “Ao invés de investir num jogador de grande porte, ele resolveu investir no pequeno. Esses jogadores vieram enquanto pequenos, então o Goiás revelou, vendeu e fez grana com esses caras”, completa Rafael.
Como foi uma prática que deu certo no primeiro mandato de Raimundo, resolveram repetir a fórmula no segundo. Só que contratações equivocadas como Diego e Johnson, Dodô e Jardel, de problemas de saúde como o de Fabrício Carvalho e da indisciplina de jogadores como Welliton, o Goiás passou a ter um gasto maior que a receita com seus jogadores.
Para um clube que tem um custo de um milhão de reais por mês era de se esperar que em algum momento a bomba estouraria. Como empresa, o Goiás tem dívidas que precisa saldar, como os salários dos jogadores e os custos de estrutura. Como o Campeonato Goiano em cinco meses não rende isso, e o clube não vendeu jogadores como de costume, o jeito foi esperar pelo Brasileirão.
Mesmo assim, o clube não se tornou impraticável. O Goiás conta com o patrocínio da Puma e da Fiat, além de ter contado até pouco tempo com um técnico do gabarito de Geninho e jogadores como Petkovic e André Leone no elenco. No sufoco e com o time trabalhando no vermelho durante seis meses, o Goiás tem suado a camisa para conseguir honrar as dívidas a longo prazo, que são os contratos.

Falta de projeto
Além dos problemas internos por que tem passado atualmente com o seu elenco, o Goiás revelou ainda que é um time que não tem projeto para vencer os campeonatos que disputa. O clube sentiu na pele os efeitos da falta de planejamento e começa a organizar a casa após as derrotas no Campeonato Goiano, da vergonha na Copa do Brasil, ao perder para o Bahia no Serra Dourada, e de um começo capenga no Brasileirão.
Após passar também pelas turbulentas saídas de Petkovic e Geninho, o departamento de futebol do clube colocou à disposição seis jogadores para negociação. Marcinho, Johnson, Cleber Goiano, Aldo, Fabiano e Romerito ficaram treinando separados do elenco principal à espera da reintegração em outros times do país. Na semana passada, Aldo e Johnson foram emprestados no esquema dois por um, em troca de Harison, do União Leiria de Portugal.
A prática de revelar e vender jogadores e não formar uma base sólida para disputar os campeonatos é um problema que irrita torcedores. Para Rafael Gobardo “o melhor do Vila Nova quer jogar no Goiás para chegar num time como o São Paulo. Nós vamos sempre tirar os melhores jogadores do Atlético, do Vila, e o São Paulo sempre vai tirar os jogadores do Goiás. Sabe o que é o Goiás a nível nacional? Uma vitrine, nada mais do que isso, apenas uma vitrine”.Então, dos problemas de um time que garganteia todos os anos que é o maior do Centro-Oeste, que tem a melhor estrutura, e leva o Campeonato Goiano como um preparatório para o Brasileiro, parece que o menor deles é o financeiro. Com uma posição cômoda no Campeonato Brasileiro, entre uma negociata e outra e a falta de projeto do clube, o time deixa a impressão que ganha um grande título a hora que quiser.